Partindo dos conceitos expostos por Benjamin em seu mais famoso ensaio, A Obra de Arte na Era de sua Reprodutibilidade Técnica, de 1936, dentre as várias possibilidades, podemos constatar que mesmo a mais perfeita reprodução de uma obra de arte carece da presença, do “aqui e agora” da obra original, de sua existência única no espaço em que se encontra. Sendo assim, diante da reprodução técnica o original mantém sua plena autoridade, pois a sua “aura”, sua autenticidade, o aqui e agora num determinado espaço e tempo, jamais serão colocados na cópia.
Mas a reprodução técnica da obra de arte não era vista por Benjamin como algo negativo, pelo contrário. As reproduções possibilitaram uma maior democratização da arte e até mesmo criaram novas formas de produção artística, que, antes da reprodução em massa seriam impossíveis. É o caso, por exemplo, do cinema. As vanguardas do início do século XX e a arte moderna em geral se beneficiaram dessas possibilidades, resgatando e apresentando novas produções artísticas através de cópias reproduzidas.
O fato é que os meios de reprodução técnica se ampliaram e hoje se apresentam de formas diversas, temos como exemplo as obras de arte vistas no ambiente virtual. As imagens reproduzidas e transmitidas online, e as formas de visualização que elas oferecem, mudaram a apreciação do espectador sobre as mesmas. De certa maneira, qualquer obra reproduzida implica outra forma de ver, mas, plataformas como o Google Art Project, por exemplo, elevam esta mudança à extremos.
Usaremos aqui, estritamente, a pintura como exemplo. Devemos nos atentar ao fato de que as pinturas, quando feitas, foram pensadas e criadas pressupondo certo distanciamento do espectador. Mas hoje, com as câmeras de alta definição que capturam as imagens que posteriormente são inseridas nas plataformas online, podemos e queremos ver a cerne destas pinturas, podemos ampliar e ver detalhes e formas que até mesmo o próprio pintor não teve acesso.
Pode parecer que esta nova possibilidade de visualização em nada altera nossa relação com as obras, mas este novo meio certamente afeta nossa forma de recepção e apreciação da obra de arte, que agora passa a ser conduzida por um “olho não humano”. Se não temos consciência desse fato em nossas “visitas” virtuais corremos o risco de cair no abismo da fragmentação que estes próprios mecanismos sugerem.
Em toda imagem reproduzida é incorporada uma nova forma de ver, uma reprodução fotográfica implica outra postura frente à imagem observada. Mas se essa mudança já era evidente, desde as reproduções impressas, com a reprodução em um espaço virtual, o que temos não é somente uma forma de visualização alterada, mas sim, uma fruição totalmente diferente da realidade da própria pintura.
Durante a reprodução ou exposição da obra de arte, através de meios que conduzem a uma visualização do “invisível”, devemos estar atentos que a própria singularidade da obra foi alterada, a imagem se divide em vários sentidos, se fragmenta em uma experiencia diluída e distante.
Que esta fragmentação, ou essas novas formas de ver, não se tornem mais importantes ou mais interessantes, do que o desejo de vivenciar a pintura ou qualquer outra obra de arte em sua integridade.
Evandro Santos
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Referências:
BENJAMIN, Walter – A Obra de Arte na Época da sua Possibilidade de Reprodução Técnica. In BARRENTO, João (Org.) – A Modernidade. Lisboa: Assírio & Alvim, 2006, p. 207-241.
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