A ditadura dos imojis

E se, de um momento para o outro, se iniciasse a inserção dos tão famosos “smiles”, nos variados modelos de escrita do que está à nossa volta ? Ora vejamos, o resultado…

“ – Aqui tem! – dirigiu-se ao padre Terrier, um monge calvo e cheirando um pouco a vinagre, que lhe veio abrir-lhe a porta.
E pousou o cesto na soleira da porta.
– O que é isto ? – questionou Terrier, ao mesmo tempo que se inclinava sobre o cesto e cheirava, supondo tratar-se de víveres.
-O bastardo da infanticida da Rua aux Fers!
O padre remexeu no cesto, até pôr a descoberto o rosto do recém-nascido adormecido.
-Está com bom aspecto! – observou. – Com as faces rosadinhas e bem alimentado.” (…)

“ O Perfume, História de um assassino, de Patrick Suskind ”

Ficaria qualquer coisa deste género:

“ – Aqui tem! 😉
E pousou o cesto na soleira da porta.
O que é isto ? 😕
O bastardo da infanticida da Rua aux Fers! 😅
O padre remexeu no cesto, até pôr a descoberto o rosto do recém-nascido adormecido. 😇
Está com bom aspecto! – 😋 – Com as faces rosadinhas e bem alimentado. 😊” (…)

É flagrante o empobrecimento textual que se verifica num simples excerto. Poderão retorquir, dizendo que assim são mais visíveis as emoções e estados através da utilização “ da carinha correspondente” , contudo, a meu ver, esta só por si torna-se bastante redutora já que a grande ambiguidade leva a que cada um interprete a figura de um modo diferente.
Contudo, não vem de agora a tentativa de “ilustração” das palavras, desde sempre, que o homem procura colmatar a dificuldade que tem em exprimir-se por palavras, ou melhor, exprimir-se com as palavras certas, através da inserção de imagens que correspondam ao que pretendem transmitir. Inicialmente, tal poderia ser justificado, por exemplo na Idade Média, devido da necessidade de “educar” através de imagens, já que apenas uma infima parcela da população era alfabetizada.
De modo algum poderemos querer equiparar a escrita de uma simples sms a um romance, contudo não é o facto de cada vez mais os “smiles” serem utilizados na escrita corrente, mas sim o facto de estes servirem atualmente para substituir palavras, situação que acaba por culminar num progressivo “esquecimento” do lirismo que as palavras em si comportam.

Francisca Cruz


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